domingo, 9 de junho de 2013

Vem isto a propósito da tão "orquestrada" contestação à greve dos professores...






O direito à greve faz parte do conjunto de direitos que definem uma democracia. 


Sem direito à greve não há democracia, como sem direito à propriedade também não há democracia.        Resultou, como muitos direitos, de uma longa, dura, e em muitos países inacabada, luta social, pejada de mortos, feridos, exílios, despedimentos, expulsões de casas, prisões.    Existe na lei portuguesa desde o 25 de Abril de 1974, está regulamentado e constitucionalmente protegido.    Mas, apesar de ser um direito, parece que exercê-lo para além do "simbolismo", é um crime.

Entendamo-nos:    greves "simbólicas" são manifestações muito especiais, mais agressivas, levando a rua para dentro dos locais de trabalho, mas não são verdadeiramente greves.    A greve é uma paralisação do trabalho cujo objectivo é pressionar alguém, patrão, empresa, sindicato  (sim, os sindicatos podem estar do "outro" lado), estado, governo para obter uma qualquer reivindicação de natureza laboral ou política.    Convém lembrar que há greves por objectivos políticos, como foram as do "Solidarnosc" na Polónia, e nenhuma lei em países democráticos as pode proibir. 

Pressionar significa usar uma força, neste caso o prejuízo que decorre da interrupção do trabalho, para obrigar o "outro" lado a ceder ou a ponderar entre vantagens e prejuízos.    É por isso que as greves que são greves e não greves "simbólicas" tentam maximizar os prejuízos como instrumento de pressão.    Por exemplo, os trabalhadores rurais alentejanos faziam greve quando das ceifas e não quando das mondas, no Verão e não no Inverno.     Durante o pequeno período de tempo a sua força negocial por salários mais altos era considerável.    Os cereais podiam apodrecer se não fossem colhidos a tempo, havia o risco de mau tempo estragar uma colheita, e dos incêndios (alguns intencionais) destruirem uma seara.    Passado este período, a força negocial dos trabalhadores rurais desaparecia, e ficavam sazonalmente desempregados, ou quando muito faziam as mondas e muitas vezes, como forma escondida de subsídio de desemprego pago pelo Estado, iam apanhar pedras nos campos e empilha-las.    A monda química e a introdução de maquinaria teve efeitos devastadores no preço e na quantidade de mão-de-obra necessária e levou à emigração de muitos milhares de trabalhadores rurais alentejanos.

Por isso quem faz greve a sério, escolhe os momentos que mais prejuízo provocam, como fazem os pilotos da TAP, os maquinistas da CP, os trabalhadores dos transportes, os professores,  e, numa sociedade civilizada, definem-se os serviços mínimos para impedir a disrupção social para além dos limites do aceitável.    Mas os serviços tem que de facto ser mesmo "mínimos", e os prejuízos fazem parte da conflitualidade consentida pela pluralidade de interesses na sociedade.

O que disse atrás não é comunismo, nem socialismo, nem radicalismo, nem fascismo, nem coisa nenhuma acabada em ismo.    É o modo como nas sociedades democráticas se defrontam os conflitos sociais e políticos, com custos sociais, mas se não for assim é pior.    A começar para a democracia, coisa a que cada vez se liga menos.


(Por Pacheco Pereira, no Abrupto)


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